Denunciar o sexismo é um esporte em ascensão

Quando uma autoridade russa descreveu Serena e Venus Williams como “os irmãos Williams”, ele virou a piada. por The Observer publicado 10/11/2014 

Serena Williams

Serena Williams: apesar de todas as vitórias no esporte, ainda há quem pense: “É musculosa demais, não é?”

Lauren Laverne, Carta Capital – 2014 é um ano terrível para ser um idiota sexista. Pergunte ao presidente da Federação Russa de Tênis, que foi suspenso e multado por descrever Serena Williams e sua irmã, Venus, como “os irmãos Williams” na televisão. À primeira vista, a história é deprimente. Os comentários de Shamil Tarpischev são um lembrete de que até mulheres com realizações superlativas não podem evitar ser julgadas pela aparência acima de qualquer outra coisa.

Esta costumava ser toda a conversa sobre mulheres na visão do público. As palavras mudaram, mas o tom há muito tempo é o mesmo: Serena Williams ganhou 18 títulos individuais no Grand Slam, 13 duplos no Grand Slam e três medalhas de ouro olímpicas, mas… ela é um pouco musculosa demais, não é?

É impossível pensar em uma figura pública feminina que não tenha sido submetida a esse tipo de crítica idiota (mas, se você quiser se sentir mal com exemplos recentes, experimente uma busca online pelos seguintes eufemismos em tabloides: “sem maquiagem”, “exibe silhueta cheinha”, “peso pós-bebê”). No entanto, apesar das aparências, a história das irmãs Williams não é deprimente, porque não é sobre elas, é sobre Tarpischev e outros semelhantes.

Repito: 2014 é um ano terrível para ser um idiota sexista. Até recentemente, a misoginia casual era passável, assim como as pessoas que a propagavam (eu as chamaria de Misóginos Casuais, mas alguém – talvez Richard Keys e Andy Gray – poderia roubar o nome para sua banda horrível). Ultimamente, porém, as coisas mudaram. Graças à quarta onda do feminismo, as pessoas começaram a identificar e denunciar o comportamento sexista (passos de bebê, mas na direção certa: Everyday Sexism é hoje um projeto de ativismo social poderoso, assim como uma lamentável circunstância enfrentada por pessoas que têm vagina).

Quando começamos a percebê-lo, começamos a percebê-los. Muitos Shamil Tarpischevs. Seu mau passo em si evidencia ao mesmo tempo a normalidade da misoginia e a mudança de atitude em relação a ela. Ele obviamente esperava que seus comentários provocassem nada mais que risos polidos. Na verdade, provocaram a condenação internacional, assim como a censura profissional e financeira. Como dizem na Rússia, “ync” (oops).

Outros exemplos são fáceis de encontrar. Em toda parte, as pessoas de repente começaram a ver o que esteve aí o tempo todo e a exigir que os responsáveis se explicassem. A União Nacional dos Estudantes realizou uma pesquisa sobre a chamada “cultura dos rapazes” e está pedindo que as universidades tomem medidas. O Guardian indicou a escassez indesculpável de mulheres na mídia, a Câmara dos Lordes lançou uma pesquisa sobre as experiências das mulheres no jornalismo e em transmissão de atualidades. Feministas destacadas como Caitlin Moran apontam repetidamente que o feminismo precisaria ter tantos homens a bordo quanto possível para alcançarmos a igualdade de gêneros, e a ONU lançou sua campanha HeForShe (ElePorEla) com um discurso de Emma Watson.

Nem tudo é oficial, porém, nem extremamente sério. Um de meus momentos favoritos na internet este ano foi criado pela revista online The Vagenda, que convidou as leitoras a satirizar manchetes de tabloides removendo o sexismo (quase todas as palavras). De modo interessante, esse desprezo bem sucedido tornou-se uma espécie de meme online por si mesmo, como a reportagem da Businesswoman Media sobre o casamento de Amal Alamuddin e George Clooney — “Aclamada advogada Amal Alamuddin casa-se com ator”.

2014 é um ótimo ano. Pela primeira vez, pessoas poderosas não podem mais esperar que seu comportamento sexista passe despercebido. Isso não vai derrubar o patriarcado da noite para o dia, mas essa sutil mudança cultural está abalando suas fundações. É importante. É progresso.

Leia mais em Guardian.co.uk

Fonte: Carta Capital, publicado em 10/11/2014.

Page Reader Press Enter to Read Page Content Out Loud Press Enter to Pause or Restart Reading Page Content Out Loud Press Enter to Stop Reading Page Content Out Loud Screen Reader Support