Telia Negrão*/ZH – A 4ª Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Pequim/Beijing, em 1995, reafirmou os direitos humanos das mulheres e obteve compromisso dos Estados Parte para sua consecução através de uma Plataforma. Beijing adotou enfoque das relações de gênero, que considera as desigualdades como historicamente construídas e mantidas pela cultura.
A Comissão sobre o Status da Mulher – CSW, da ONU, se reúne em Nova Iorque, partir deste domingo, para avaliar 20 anos de implementação da Plataforma de Beijing. Os temas centrais do debate são o empoderamento das mulheres e meninas e o desfrute pleno e equitativo de todos os direitos humanos. A integração de uma perspectiva de gênero nas dimensões econômica, social e ambiental do desenvolvimento sustentável continua como tema-chave nas negociações. Entre os 45 países que compõem a CSW, há os que não reconhecem a pertinência no enfoque das relações de gênero e justificam violações como parte das tradições culturais e religiosas de seus países. É o caso das mutilações genitais e dos casamentos infantis nas versões mais extremas, mas também persiste a negação do direito à educação, à sexualidade, à autonomia pessoal.
O quadro não é animador, pois apesar de significativos avanços, como a existência de planos nacionais, legislações para a violência e criação de organismos de gestão de politicas públicas, em vários países nega-se o direito à participação, à cultura, consideradas esferas masculinas.
A Declaração da Sociedade Civil critica a lentidão na implementação dos 12 pontos de Beijing: pobreza, educação, saúde, violência, conflitos armados, economia, poder e tomada de decisão, mecanismos institucionais para o progresso das mulheres, direitos humanos das mulheres, a meios de comunicação, meio ambiente e as meninas. Houve agravamento quanto à violência sexual e a epidemia de HIV, e ganharam maior dimensão o tráfico de mulheres e meninas, turismo e exploração sexual.
No caso brasileiro, o Comitê da Cedaw/ONU acaba de emitir mais uma Recomendação ao Brasil para que amplie os direitos reprodutivos das mulheres, medida fundamental para reduzir mortes ou morbidades ligadas a perfurações uterinas, hemorragias e infecções. Concretamente, pede ao governo que negocie com setores religiosos no congresso nacional para evitar a aprovação de legislações mais proibitivas ao aborto e assegure atenção integral à saúde.
O chamado à ação mundial desta histórica reunião pode e deve ser uma motivação para que mais setores da sociedade e do estado se mobilizem para reduzir padrões de desigualdade de gênero. Vai projetar, afinal de contas, os próximos 20 anos, afetando mais uma geração.
*Cientista política, relatora nas Nações Unidas
Fonte: Publicado em 06 de março em Monitoramento da Cedaw.