A principal entidade do país que representa os profissionais da área defende o direito da mulher de interromper a gestação até a 12ª semana de gravidez. Apesar da reação no Congresso Nacional, proposta será levada à comissão do Senado que prepara a reforma do Código Penal.
Pela primeira vez, o Conselho Federal de Medicina (CFM) se posicionou sobre o aborto no Brasil. A autarquia defendeu ontem a liberação da prática até o 3º mês de gestação. Atualmente, a interrupção da gravidez só é permitida em caso de estupro, anencefalia e risco de morte para a mãe. Em todas demais circunstâncias, o aborto é considerado crime, com pena de 1 a 3 anos de prisão. O CFM enviará à comissão especial do Senado que avalia a reforma do Código Penal um documento com a manifestação formal da entidade. Entre as propostas da comissão está, justamente, a descriminalização do aborto. O projeto de lei em discussão autoriza o procedimento desde que a mulher tenha um laudo assinado por médico ou psicólogo constatando a falta de condições psicológicas de arcar com a maternidade. Mas o pré-requisito, para o CFM, é desnecessário.
A decisão da autarquia foi tomada no início do mês, em um encontro dos 27 conselhos regionais de medicina do país. O posicionamento pró-aborto contou com a aprovação de 80% dos representantes da categoria. Para o presidente do CFM, Roberto Luis d´Ávila, a medida se baseia na preservação da autonomia das mulheres e no ponto de vista da saúde pública. “Há uma hipocrisia social. Quem tem condições financeiras, faz o procedimento de maneira segura. Quem é pobre faz em condições erradas e enriquece as estatísticas de mortalidade inaceitáveis”, avaliou o presidente.
Segundo a Pesquisa Nacional de Aborto, financiada pelo Ministério da Saúde, uma em cada cinco brasileiras, aos 40 anos, já fez ao menos um aborto na vida. E metade dessas mulheres teve que ser internada por complicações decorrentes da prática clandestina. Só no ano passado, 180 mil curetagens foram feitas na rede pública de saúde, ao custo de R$ 40 milhões. Apesar do posicionamento do CFM, D”Ávila não acredita que a descriminalização do aborto vá ocorrer em breve no país. “O Brasil é um dos países que menos avançaram nesse debate. Portugal, extremamente católico, já se decidiu por descriminalizar o procedimento”, exemplificou o presidente da entidade.
Ele também rechaça a ideia de que, caso se torne legal, a prática do aborto será mais recorrente. “Não acho que o número aumentaria. É uma decisão sofrida e quem decide tomá-la faz o aborto independentemente de ser ilegal ou não.” Para ele, a mudança na lei permitiria às mulheres que optassem por não levar a gravidez adiante ser atendidas em ambientes seguros, limpos e com mais acesso a antibióticos, por exemplo.
Critério técnico:
O período de três meses para a mulher decidir abortar, sem qualquer punição legal, obedece critérios médicos, segundo o presidente do CFM. Ele explica que o intervalo de 12 semanas é considerado um tempo de gestação seguro para o procedimento de limpeza da cavidade uterina. Depois disso, o aborto passa a representar alto risco para a mulher. Outro ponto esclarecido por d´Ávila é que geneticistas creem que, a partir do terceiro mês, já existe formação do sistema nervoso central do embrião. “Nesse momento, o feto já teria sensibilidade suficiente para, caso fosse agredido, sentir tudo.”
Um dos conselhos regionais de medicina que não concordaram com o CFM foi o de Minas Gerais. “A posição do conselho é contra o aborto da forma como a reforma do Código Penal propõe, porque pensamos que há formação da vida já na fecundação. E, a partir daí, a posição do médico é de defendê-la”, esclareceu o presidente do conselho mineiro, João Batista Gomes Soares. Ele entende que o pai também precisa ter o direito de opinar sobre a decisão da mulher.
Texto de: Julia Chaib e Renata Mariz. 22/03/2013 – Jornal Correio Braziliense. Em: http://www.unb.br/noticias/unbagencia/cpmod.php?id=94319
Campanha Dia 28 de setembro – No Brasil, 200 mil mulheres fazem o procedimento de curetagem pelo sistema público de saúde por ano, procedimento muito utilizado após o processo abortivo. Este procedimento quando realizado sob condições precárias – por pessoas sem a necessária capacitação ou em ambientes que não apresentem os mínimos padrões sanitários – causa sequelas à saúde da mulher e, muitas vezes, sua própria morte.
Com o slogan “Aborto legal e seguro: uma questão de direitos, uma questão de democracia”, a Campanha 28 de Setembro pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe estimula uma reflexão sobre as leis vigentes e as questões do aborto inseguro, sua clandestinidade e as consequências na saúde das mulheres. A campanha foi criada em 1990, no V Encontro Feminista da América Latina e no Caribe, realizado na Argentina.
Apesar de o Brasil ter ratificado tratados internacionais sobre Direitos Humanos e direitos reprodutivos da mulher, o aborto ainda é proibido no país, salvo casos especiais. As leis e políticas brasileiras sobre o assunto foram questionadas pela ONU, que cobrou posição do governo brasileiro durante a 51ª sessão do Comitê Para a Eliminação de Discriminação Contra as Mulheres em fevereiro em Genebra.
No Brasil, o responsável pela campanha é a Rede Feminista de Saúde, em parceria com o Instituto Mulher pela Atenção Integral à Saúde e Direitos Humanos – IMAIS/Bahia.
A Revista Ciência & Saúde Coletiva de julho traz dados alarmantes: uma em cada cinco mulheres aos 40 anos já fez pelo menos um aborto. Metade dessas mulheres utiliza medicamentos para fazer aborto, e a outra metade precisou ficar internada para terminar o aborto. Os dados foram levantados pela pesquisa Aborto no Brasil, de autoria do economista e sociólogo Marcelo Medeiros e a da antropóloga Debora Diniz, ambos professores da Universidade de Brasília (UnB). Os pesquisadores receberam o prêmio Fred L. Soper à Excelência em Literatura sobre Saúde Pública pelo estudo. Entre os méritos do trabalho financiado pelo Ministério da Saúde, está a identificação da magnitude do aborto no país.
Publicações analisando dados de 1995 a 2008, um levantamento do instituto americano Guttmacher mostra que as mais altas taxas de abortos estão justamente em regiões com legislação restritiva. O estudo publicado na revista médica The Lancet contraria o argumento de que leis severas contra o aborto reduzem a disseminação da prática.
A Campanha enfoca o aborto a partir das seguintes considerações:
- como um problema de saúde pública, por seu impacto na saúde das mulheres;
- como uma questão de direitos humanos e de democracia, vinculado a uma maternidade livre e voluntária;
- como um assunto de justiça social, uma vez que são as mulheres pobres as que mais sofrem com a prática do aborto inseguro;
- e como uma defesa do Estado Laico.
Fonte: Jornal da Associação Brasileira de Enfermagem-ABEn, Ano 54 – Nº 03 – Jul./Ago./Set., página 10, 2012. Brasília – DF – Brasil ISSN 1984-9761 .
Acesse o Jornal ABEn: https://mail-attachment.googleusercontent.com/attachment/u/0/?ui=2&ik=b17dddb03e&view=att&th=13d934907ec4639b&attid=0.1&disp=inline&realattid=2e233d181c0f1848_0.1&safe=1&zw&saduie=AG9B_P_AFVUiazq_gztGadI-Mwb6&sadet=1364243845110&sads=Mp_qTQGIKOceHV2i3UjZxgK_o4Y&sadssc=1
Acesse o material da campanha: sededeque.com.br/28desetembro/