Isabella Sander/Jornal do Comércio – O ano é de eleições. Por isso, este Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março, chega com grandes discussões a respeito da presença feminina em cargos de poder. Segundo a coordenadora-geral do Coletivo Feminino Plural (CFP), Telia Negrão, apenas 10% das vagas em posições de poder e decisão no Brasil são ocupadas por mulheres. Em uma luta por direitos que existe desde o século XVIII e que já teve diversos avanços, a batalha, agora é rumo à igualdade entre os gêneros em todos os campos.
Líderes feministas defendem avanço em direção à igualdade na representação pública (Fredy Vieira/JC)
Para a mestra em Ciência Política e colaboradora do Núcleo Interdisciplinar de Estudos de Mulher e Gênero da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elena Schuck, a mídia insiste em objetificar a mulher, dando importância aos padrões de beleza e que, assim, geram uma sensação de que o papel feminino é preocupar-se com a aparência. “Assim, elas não têm o papel de ter voz em discussões mais aprofundadas, como na política. É um desafio mudar isso, já que é um modelo democrático. Mas democrático para quem, quando as mulheres não estão no parlamento e se exclui quase 50% da população dos quadros de poder?”, questiona.
Elena cita como consequência da falta de representatividade a tramitação do Estatuto do Nascituro, projeto de lei de 2005 que defendia a alteração do código penal, para considerar o aborto como crime hediondo e o proibir em todos os casos. “Sempre existem essas ondas contrárias, mesmo que estejamos vivenciando um momento de conquistas. As jovens estão participando mais do movimento feminista, percebendo que não há igualdade entre os sexos. A consciência é cada vez maior”, garante.
Além disso, conforme a pesquisadora, há maior respaldo institucional, com a criação de secretarias federal e estaduais específicas para a população feminina. “A Lei Maria da Penha, que criminaliza a violência doméstica, foi uma conquista importante para pararmos de achar que ninguém deve se meter em brigas de casais. É um reconhecimento institucional de que a luta das mulheres é importante, é democrática e é pela igualdade”, enfatiza.
O CFP trabalha, de acordo com Telia, com temas relativos à autonomia feminina e ao direito de decisão das mulheres. “Tentamos inverter esse funil de gênero, que leva à falta de representatividade das mulheres nos Três Poderes”, explica.
A coordenadora do Coletivo cita o cientista político José Murilo de Carvalho, que definiu que o Brasil segue três tradições políticas. “A primeira é a família patriarcal, masculina, dominadora, agressiva e opressora, que criou na sociedade a ideia de que as mulheres são propriedade dos homens e que elas devem se submeter a eles. A partir disso, podemos compreender toda a questão da violência e da ausência feminina nos espaços de poder e decisão”, destaca.
“A segunda tradição é a escravista, que leva a ideia de que outras pessoas devem fazer o nosso trabalho, que ele pode ser explorado e que, portanto, as pessoas podem trabalhar e ganhar pouco. E, por fim, há a tradição do patrimonialismo, a concepção de que o que é público também é privado e de que nós podemos usar livremente os bens públicos, porque nada acontecerá. Isso explica o problema nacional da corrupção”, analisa.
Esses elementos justificam, para Telia, o conceito de que lugar de mulher não é na política, porque esse lugar é dos homens, que não querem largar essa posição. “É uma questão de física: dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo. Temos 500 lugares no Congresso Nacional e, para que 250 destes sejam preenchidos por mulheres, temos que tirar 230 homens de lá. Aí, enfrentamos resistência cultural, política e econômica”, pondera a coordenadora.
Fonte: Monitoramento da Cedaw. Publicado em 07 de março de 2014.